Governança Corporativa e Aspectos Comportamentais dos Processos Decisórios

1- Introdução

A Governança Corporativa tem recebido importância cada maior nas agendas empresariais dos países, inclusive no Brasil. O principal objetivo da governança é gerar valor com base em uma administração ética para acionistas e stakeholders, promovendo o crescimento e a perenidade das empresas. No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) são entidades que disciplinam e promovem as melhores práticas de governança regendo-se pelos princípios a seguir citados.

2- Princípios de Governança Corporativa

Os cinco princípios fundamentais de governança corporativa, conforme adotados pelo IBGC, são:

a) Transparência: A transparência implica em divulgar informações essenciais para a tomada de decisão dos stakeholders, não se limitando às exigências legais. Empresas que adotam este princípio

publicam relatórios de sustentabilidade seguindo diretrizes internacionais, como as do GRI-Global Reporting Initiative que é uma organização internacional de padrões independentes que ajuda empresas, governos e outras organizações a compreender e comunicar os seus impactos em questões como as alterações climáticas, os direitos humanos e a corrupção e disponibilizam informações em portais de governança para reduzir a assimetria informacional.

b) Equidade: Este princípio destaca a importância de tratar cada stakeholder de acordo com suas necessidades e expectativas específicas, ao invés de tratar todos de maneira igual. Isso implica em reconhecer e responder às diferentes demandas de acionistas majoritários e minoritários de maneira eficiente.

c) Prestação de Contas (Accountability): A prestação de contas vai além da simples entrega de resultados, incluindo a responsabilização por ações e decisões tomadas. Isso envolve a utilização de seguros de responsabilidade civil, como o D&O, para proteger os executivos e a empresa contra ações que causem danos involuntários a terceiros.

d) Responsabilidade Corporativa: Este princípio engloba a sustentabilidade econômica, social e ambiental, considerando impactos nos capitais intelectual, humano, social, ambiental, manufatureiro e reputacional da empresa. A alta gestão deve adotar comportamentos éticos e colaborativos para garantir a sustentabilidade.

e) Integridade: Este princípio foi agregado mais recentemente e tem o propósito de estabelecer a busca contínua do aprimoramento da cultura ética da empresa, vale dizer perseverar no caminho de evitar a influência de conflitos de interesses e mantendo a coerência entre o discurso da empresa e de suas ações. Esse alinhamento deve ser procurado através de práticas como gerenciamento e mapeamento de riscos de integridade, treinamento contínuo em todas as faixas decisórias e atenção ao comportamento dos líderes bem como criar ambientes na empresa que induzam o máximo a transparência de comportamento tais como, salas de portas abertas e/ou envidraçadas e comunicação clara e transparente dos fatos da empresa.

3- Governança Corporativa e Aspectos Comportamentais do Processo Decisório

Cada organização tem o seu processo decisório específico baseado em seus valores, escolhas e da cultura que pratica e que influenciam os respectivos comportamentos. Neste item vamos citar algumas teorias mais importantes sobre o comportamento dos órgãos colegiados das organizações, aí considerando as Assembleias Gerais, Conselhos de Administração, Conselhos Consultivos, Conselhos de Familia, Conselho Fiscal e os diversos órgãos de assessoramento técnico desses colegiados tais como os Comitês de Risco, de Auditoria etc. que podem afetar o processo decisório. Dentre essas teorias detalharemos a seguir a Teoria da Agência, a Teoria dos Jogos, a Tragédia dos Comuns e os Vieses das Pessoas na Tomada de Decisões:

a) Teoria da Agência: Esta teoria aborda os conflitos de interesse entre acionistas (principais) e gestores (agentes). Conflitos surgem quando gestores priorizam interesses pessoais em detrimento dos acionistas, como no caso de estruturas de propriedade pulverizadas ou concentradas.

b) Teoria dos Jogos e a Teoria da Tragédia dos Comuns: A Teoria dos Jogos, especialmente o Dilema dos Prisioneiros e o Equilíbrio de Nash, explora a cooperação e competição entre partes. A Tragédia dos Comuns destaca os problemas de exploração excessiva de recursos comuns e finitos, mostrando como ações individuais e isoladas podem prejudicar a coletividade a longo prazo.

c) Vieses na Tomada de Decisões: Heurísticas e vieses influenciam significativamente as decisões. Teóricos como Daniel Kahneman, Anos Tversky, ganhadores do prêmio de Ciências Econômicas em 2002, e ainda Robbins (2000) e Freeman e Stoner (1992) identificaram vieses comuns, como a Heurística da Disponibilidade, (decisão baseada na probabilidade de algo acontecer , probabilidade esta que se baseia somente na nossa capacidade de lembrar as ocorrências, isto é na memória), a Heurística da Representatividade (decisão baseada na probabilidade de um evento acontecer pela semelhança com outro evento) e Heurística da Ancoragem (decisão baseada na possibilidade de evento acontecer a partir de uma referência anterior conhecida) que moldam as decisões de forma não racional. Importante citar que muitas vezes o nosso cérebro pode se valer de mais de uma heurística simultaneamente em um processo decisório. Conhecer e mitigar esses vieses é essencial para melhorar a qualidade das decisões empresariais e a perfeita aderência aos princípios de governança.

4-Conclusões

A adoção dos princípios de governança corporativa, particularmente a transparência e a prestação de contas que ancoram todos os outros princípios, aliada à compreensão dos aspectos comportamentais no processo decisório, é fundamental para dar sustentabilidade as empresas e garantir o seu crescimento. Conflitos de agência, dilemas da Teoria dos Jogos e vieses decisórios representam desafios que se não enfrentados, podem comprometer a eficácia da governança corporativa, tornando crucial o desenvolvimento contínuo de mecanismos para lidar com esses fatores.

Referências Bibliográficas

– Curso de Governança Corporativa da FGV, Módulo III – Princípios de Governança e Aspectos Comportamentais do Processo Decisório

– KAHNEMAN, Daniel. *Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar*. Editora Schwarcz, 2017

– PRADO, Roberta Nioac (Coord.). *Empresas Familiares e FamíliasEmpresárias – Governança e Planejamento Jurídico e Sucessório*. Editora Quartier Latin do Brasil, 2019

– BICHETTI, José Luiz. *Governança. Gestão e Sucessão*. Saint Paul Editora, 2020

– MASSA, Rubens Mussolin; PARTYKA, Raul Beal; LANA, Jeferson. *Teoria da agência comportamental. Risco executivo. Governança corporativa*. FGV EAESP, Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI

– RASO, Nelson; JABRA, Suzaba. *Processos Decisórios do Conselho de Administração*. Comissão de Conselho de Administração – IBGC, 2016

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