Vamos falar aqui da conquista, em janeiro de 2020, do prêmio Globo de Ouro pela série dramática de TV “Sucessão” (“Succession”), uma produção da HBO. Para muitos puristas da sétima arte, o prêmio tem mais peso do que o próprio Oscar, já que este representa a opinião média do pessoal engajado na indústria do cinema, enquanto o Globo de Ouro traz o conjunto das opiniões de membros da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood. Supostamente, trata-se de um prêmio mais isento. O ator Brian Cox, que faz o patriarca Logan Roy, também foi premiado.
Com duas temporadas completas exibidas até agora, “Sucessão” atraiu olhares do alto empresariado, de muitos executivos que vivem de salário e de bonificações, de aplicadores em bolsa de valores e até mesmo de estudiosos do comportamento humano. A depender da roda de conversas em que surja, pode ser apresentada como um novelão sobre família rica que briga pela sucessão do patriarca, como uma companhia líder na área de mídia e entretenimento em que tudo passa pelo crivo dos pregões de Wall Street, ou como um ambiente tóxico em que impera o cinismo e a absoluta falta de confiança entre os pares.
Um crítico de cinema que escreveu sobre “Sucessão” afirmou que a palavra drama combina bem com as sucessões, mas que o grupo familiar retratado na série lhe pareceu um pouco exagerado. Na sua opinião, a família é rica demais, poderosa demais e desestruturada demais. Para atiçar o debate, diversos especialistas afirmam que a história foi baseada no caso real da News Corporation, de Rupert Murdoch, importante aliado do presidente Donald Trump e dono do canal de TV que leva ao ar o noticiário Fox News, o preferido do presidente norte-americano e rival da reputada CNN.
Há diversos personagens fortes, mas o foco sempre volta para o fundador (Logan Roy, que emularia Rupert Murdoch). Empreendedor astuto, Roy trabalhou duro e fez inúmeras alianças políticas vantajosas. Ao se perceber idoso e já sujeito a doenças incapacitantes (como um AVC que o acomete na primeira temporada e do qual se recuperou penosamente), Roy, ao mesmo tempo em que parece estimular o debate sobre sua sucessão, sabota o processo, confundindo ainda mais a esposa (de segundo casamento), os filhos e os executivos de primeira linha. Cobrador de atitudes e resultados, exige iniciativa e alto desempenho de seus familiares e subordinados, mas, ao mesmo tempo, dá trela a um cordão de puxa-sacos (parentes ou assalariados), que só fazem tumultuar o ambiente.
O fato de abordar o drama de uma família empresária bilionária, numa organização igualmente bilionária, não desestimula sua comparação com empreendimentos menores, sejam eles norte-americanos, brasileiros, ou de qualquer outra nacionalidade.
O que pode ser útil para as empresas medianas é notar e anotar o que é feito pelo patriarca, por seus herdeiros e pelas demais pessoas envolvidas. A série ilustra, com brilhantismo, o uso de agendas ocultas, que só tumultuam processos de sucessão. Na vida real, é muito melhor para cada um e para a organização que os desejos de todos sejam explicitados com clareza. Se um fundador ou atual líder, pela razão que for, não estiver mentalmente pronto para deixar a condição de executivo chefe enquanto seus herdeiros consideram que podem fazer melhor que ele, que isso seja posto na mesa com clareza e rapidez. A outra forma de fazer é amplificar a agonia e tolerar um processo desgastante que só irá corroer a organização, acentuar a ruptura e dilapidar o patrimônio.
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