Mais de 90% das empresas instaladas no Brasil são familiares. Mais cedo, ou mais tarde, surge o dilema da sucessão.
Para os fundadores, ou a geração que está na direção, pode parecer “natural” – quando não uma obrigação ou um privilégio – que os seus descendentes sejam seus sucessores.
Na minha experiência lidando com o tema, observo que a passagem do bastão que deveria transformar herdeiros em sucessores pode ser tudo, menos “natural”.
Herdeiro herda patrimônio. Sucessor herda trabalho! Herda responsabilidade. Herda encrenca.
Lamentavelmente, vocação e interesse em continuidade não são fatores hereditários. Com as opções que o mundo oferece às novas gerações não é surpreendente observar a quantidade crescente de herdeiros que hoje em dia não demonstram interesse em dedicar suas vidas aos negócios da família.
Nestes casos, embora possa ferir expectativas, é aconselhável deixar que sigam seus caminhos. Pode não parecer, mas a médio prazo será menos doloroso para todos…e para o negócio.
Um herdeiro somente deveria ser considerado para posições futuras de comando se demonstrar vontade e potencial inequívoco para isto. Esta é condição primeira e inegociável!
Para prenunciar um futuro promissor no comando, o sucessor deve, além de vocação e interesse, demonstrar determinação férrea, muita disciplina, humildade e paciência para perceber que sabe pouco e que tem muito a aprender, disposição para começar “de baixo” deixando de lado a sua certidão de nascimento, desenvolver sua habilidade para lidar com pessoas, entender e assumir que a melhor forma de exercer a liderança é pelo exemplo. E, é claro, ter um currículo acadêmico que o credencie.
O desafio a espera dele – num contexto cada vez mais competitivo – não é o de melhorar o seu legado em 10%, mas multiplica-lo por 10 !
A ausência de tais competências poderá contribuir para pôr em risco o negócio, colocando á frente dos empreendimentos pessoas inseguras ou mesmo egocêntricas, omissas ou autoritárias, despreparadas, que quase sempre acabarão por desrespeitar a memória e a cultura da organização, conduzindo-a rapidamente a destino indesejável.
Muitas empresas lidam inteligentemente com o processo de sucessão familiar definindo regras claras e apriorísticas, principalmente se os acionistas são vários. Nestes casos, um acordo previne que a empresa vire um loteamento de protegidos. Pode-se definir, por exemplo, que somente ingressem nos negócios os pretendentes que cursarem uma pós-graduação em escolas de primeiro nível e que antes de ingressar nos negócios da família tiverem adquirido pelo menos 2-3 anos de experiência em outras empresas. De preferência bem estruturadas e com bons modelos de gestão.
Uma vez decidido que determinado herdeiro deseja e se qualifica para entrar nos negócios da família, é de todo conveniente que participe, em paralelo à sua introdução nas atividades do dia-a-dia, de um programa de coaching / aconselhamento individual precisamente para adquirir e potencializar os aspectos “sociais” do líder e que frequentemente são relegados “ao acaso”. Me refiro a perceber e trabalhar posturas, comportamentos e atitudes. São eles que, mais do que quaisquer outros, isoladamente poderão contribuir para a perpetuidade da organização.
E se nos herdeiros não for reconhecida a vocação e as condições que seriam exigidas, em igualdade de condições, de um competente profissional de mercado?
Nesta última hipótese, se dê o tempo que for preciso para definir, sem complacência, as competências e exigências essenciais ao seu negócio. Vasculhe o mercado em busca dos melhores candidatos portadoras destes requisitos. Assegura-se, por meio de sucessivas entrevistas e referências que estas pessoas condizem com os seus valores e, principalmente, que conseguirão se alinhar e trabalhar bem com a figura dos acionistas.
Com esta cartilha em mãos estará aumentando suas chances de acerto ao transferir o poder, que em última instância significa proteger e aumentar o seu patrimônio, assegurar dividendos e a tão desejada perpetuidade.
SIMON M. FRANCO
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